Desenvolvendo Desapego no Próprio Campo – Shiwa Lha – Centro de Estudos do Budismo Tibetano

Desenvolvendo Desapego no Próprio Campo

No século passado, enquanto às pessoas matavam uma à outra, ambos os lados estavam rezando para Deus. Difícil! Ainda hoje, às vezes, você vê conflitos em nome da religião, e eu acho que ambos os lados rezam para Deus. Às vezes eu brinco, dizendo que parece que Deus está confuso! Como Ele poderia decidir, com os dois lados rezando para Ele, procurando alguma forma de benção? É difícil. Uma vez na Argentina, durante uma discussão com cientistas e alguns líderes religiosos, embora não tenha sido um encontro inter-religioso, conheci um físico com o nome de Maturana. Ele era professor do já falecido Varela e eu já havia o conhecido anteriormente na Suíça, e então na Argentina, mas nunca mais desde então. Durante sua palestra, ele mencionou que, como físico, não deveria desenvolver apego em relação à sua própria área científica. Então, essa foi uma afirmação maravilhosa e sábia que eu aprendi.

Eu sou budista, mas não devo desenvolver apego com relação ao budismo porque apego é uma emoção negativa. Quando você desenvolve apego, sua visão se torna tendenciosa. Uma vez que sua mente se torna tendenciosa, você não consegue ver as coisas objetivamente.

É por isto que acho que, na maioria das vezes, para aqueles envolvidos em conflitos em nome da religião a verdadeira razão não é a fé religiosa, mas sim interesses econômicos ou políticos.

Mas em alguns casos, como os de fundamentalistas, eles se tornam tão apegados à sua própria religião e então, por causa disso, não podem ver o valor de outras tradições.

A afirmação de Maturana foi um grande conselho para mim. Como resultado de me encontrar com muitas pessoas, eu admiro muitas outras tradições e, claro, espero não ser fundamentalista ou fanático. Às vezes eu menciono que uma vez estive em Lurdes, no sul da França. Fui como um peregrino, e, na frente de uma estátua de Jesus Cristo eu bebi um pouco de água. Eu estava na frente da estátua e refleti na minha mente, sobre o que tinha ouvido, que milhões de pessoas ao longo dos séculos que visitaram esse lugar, procurando conforto, com algumas pessoas doentes, que através de sua fé e algum tipo de benção foram curadas. Então eu refleti sobre essas coisas e tive alguma forma de sentimento profundo de apreço pelo cristianismo, as lágrimas quase vieram. E então, em outra vez, aconteceu uma coisa estranha em Fátima, Portugal. Cercado por católicos e cristãos, nós fizemos um pequeno período de meditação silenciosa na frente de uma pequena estátua de Maria. Quando eu e todos os outros estávamos para ir embora, me virei para trás e a estátua de Maria estava realmente sorrindo para mim. Eu olhei de novo e de novo, e sim, ela estava sorrindo. Eu senti que Maria parecia ter algum tipo de reconhecimento pelo meu caminho não sectário! Se eu tivesse passado mais tempo com Maria discutindo filosofia, no entanto, talvez algo mais complicado pudesse ter surgido!

De qualquer forma, até o apego pela sua própria fé não é bom. Às vezes a religião causa conflitos e divisões, e isso é um assunto um tanto sério. A religião é, supostamente, um método de aumentar a compaixão e o perdão, que são os remédios para a raiva e o ódio. Então, se a própria religião criar maior ódio contra as outras fés religiosas, é como um suposto remédio para curar a doença, mas que, ao invés disso, causa mais doença. O que fazer? Todas essas coisas tristes existem, essencialmente, devido à falta de convicção nos princípios morais, por isso eu acredito que nós precisamos de várias práticas e fatores, de modo a fazer um verdadeiro esforço para promover a ética secular.

Transcrição de um seminário , Friburgo, Suíça, Abril de 2013, levemente editado por Alexander Berzin.

Texto retirado deste site.

Vamos Conversar?